Ao
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA

A/c Sr. José Carlos Carvalho
C/cópia: Consema-SP/CADES

O Coletivo de entidades ambientalistas, todas elas cadastradas junto ao CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Conselheiros do CONSEMA, bem como as associações de bairro e demais entidades abaixo assinadas, vêm à presença de V. Exa. para manifestar seu mais forte repúdio e sua total indignação em relação ao contido no art. 1º, parágrafo único, inciso XVI da Resolução nº 292, de 21 de março de 2002.

O indigitado texto legal exclui as associações de moradores da possibilidade de se cadastrarem como entidades ambientalistas junto ao CONAMA, ainda que tais entidades se dediquem de qualquer forma às causas ambientais.

Ora, essa exclusão é simplesmente absurda. O Brasil é um país essencialmente urbano, com cerca de 80% (oitenta por cento) de sua população vivendo nos grandes centros, e justamente nesses lugares há diversos problemas ambientais, tais como áreas contaminadas, destinação de resíduos sólidos, poluição atmosférica, preservação do patrimônio histórico, preservação de áreas verdes, preservação de fontes de mananciais, má utilização do solo urbano, etc. Nota-se ainda a falta de planejamento territorial, que continua a concentrar atividades em áreas já ambientalmente saturadas, com sua capacidade de suporte comprometida, principalmente nas grandes cidades.

Do ponto de vista legal, por sua vez, é absolutamente insustentável a não inclusão das questões urbanísticas (de que se ocupam as associações de bairro) como essencialmente ambientais. A recente entrada em vigor do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/01) alçou a ordem urbanística à categoria de interesses difusos que podem ser defendidos através da ação civil pública.

Portanto, é mais do que evidente e comezinho que a função precípua das associações de bairro é a luta pela preservação da qualidade de vida nos centros urbanos, através das diversas formas de proteção ambiental. Na verdade, a Resolução em comento pretende de maneira clamorosamente autoritária enfraquecer a luta ambientalista empreendida pela socidade civil no Brasil, uma vez que é facilmente constatável que, nos centros urbanos, onde a informação, a politização e a consciência dos cidadãos costumam ser maiores que nos centros rurais.

O que se quer é afastar, portanto, entidades representativas e atuantes para que se diminua e até mesmo se anule a indispensável fiscalização da sociedade civil dos atos governamentais na área ambiental.

Aliás, o próprio texto da Resolução em exame é contraditório, pois propõe a exclusão das associações de bairro do cadastramento das entidades ambientalistas, "ainda que se dediquem de qualquer forma às causas ambientais".

Com que direito, através de simples Resolução, extrapolando em muito seu poder regulamentar, o que é próprio dos autoritários e dos avessos à democracia, pretende esse conselho descadastrar entidades que se dedicam às causas ambientais do cadastramento de entidades ambientalistas? Onde encontra amparo para tamanho contra-senso?

Na verdade, as entidades de bairro não apenas se dedicam às causas ambientais, mas são na essência, e de maneira inquestionável, entidades ambientalistas. Cada vez mais sua atuação profícua na defesa do meio ambiente pode ser notada, especialmente em regiões metropolitanas, como a de São Paulo.

No mais, cumpre informar V. Exa. que há diversas manifestações dos mais variados juristas afirmando que a definição de meio ambiente inclui a noção de meio ambiente urbano. Mais ainda, há diversas decisões dos mais variados Tribunais do País considerando as associações de bairro parte legítimas para ingressar com ações judiciais em defesa do meio ambiente, o que é o mesmo que admitir que são entidades ambientalistas. E essas decisões são à entrada em vigor do Estatuto da Cidade que, em função do artigo legal ali contido, supra citado, tornou não passível da mais remota dúvida a evidência dessa circunstância.

Portanto, tendo em vista esse arcabouço jurídico e social; tendo em vista que, através de simples Resolução, não pode o CONAMA dizer que entidades ambientalistas não são entidades ambientalistas, "ainda que se dediquem às causas ambientais"; tendo em vista que essa esdrúxula Resolução poderá ter efeitos negativos nos conselhos de meio ambiente dos diversos Estados, especialmente o de São Paulo, o que sabemos que é o verdadeiro objetivo, não assumido publicamente, dessa Resolução, informamos que, caso a Resolução em questão não seja revista, restaurando-se o bom senso, a democracia e a legalidade, iremos adotar as medidas judiciais que entendermos cabíveis.

Atenciosamente, as entidades abaixo assinadas:

São Paulo, 15 de julho de 2002.